Uma Teologia do Descanso


Uma Teologia do Descanso

Norbert Lieth

Ficamos surpresos e admirados quando vemos o que a Bíblia diz sobre o descanso divino, sempre disponível para nós. Acompanhe o roteiro que Deus traçou no Plano Divino de Salvação.

A primeira pessoa que descansou foi o próprio Deus: “E, havendo Deus terminado no dia sétimo a sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a sua obra que tinha feito” (Gn 2.2). Do nada, pela força de Sua Palavra, Deus criou todas as coisas visíveis e invisíveis, em apenas seis dias. Ele, que é a fonte de todo o poder, não precisa de descanso (Sl 121.4; Sl 33.9; Is 40.28). O sétimo dia de descanso tem, assim, uma função no Plano Divino de Salvação e mostra o que, desde o início, Deus queria para o homem.

Deus descansou no sétimo dia, o primeiro dia após a criação do homem, que ocorreu no sexto dia (Gn 1.26-31). Isso significa que o ser humano estava destinado a viver no descanso divino; Deus queria o homem para si mesmo, para estar com ele em Seu descanso. O ser humano deveria sujeitar a terra, ser fértil e dominar a natureza, e tudo isso a partir do descanso divino. Mas, o pecado se interpôs e destruiu esse descanso. O desassossego tomou seu lugar.

O homem descansa de suas obras porque não precisa tentar justificar-se por meio delas nem por meio do cumprimento de leis ou ordenanças.

A mulher, a partir de então, teria sofrimentos em sua gravidez e daria à luz aos seus filhos com muitas dores. O Senhor acrescentou: “o teu desejo será para o teu marido, e ele te governará” (Gn 3.16)*. O homem, por sua vez, teria de obter seu sustento com fadigas, trabalhando o solo, comendo do fruto da terra e ganhando seu pão com o suor de seu rosto. O ser humano enfrentaria a morte e voltaria à terra da qual fora feito. Além disso, as duas primeiras pessoas criadas foram expulsas do descanso de Deus (Gn 3.17-19,24).

A Bíblia continua contando a saga do descanso que Deus quer dar versus a inquietação humana, expondo como o desassossego foi aumentando continuamente em consequência do pecado. Depois que Caim, o filho mais velho de Adão e Eva, matou seu irmão Abel, o Senhor lhe disse: “Quando lavrares o solo, não te dará ele a sua força; serás fugitivo e errante pela terra” (Gn 4.12; veja também o v. 14). Assim, desde a queda em pecado a humanidade vive errante, inquieta, em sofrimento e desconsolo.

Quando o mundo estava tão degradado pelo pecado que o Todo-Poderoso teve que derramar o Dilúvio sobre a terra, Deus providenciou para que houvesse um sobrevivente juntamente com sua família. Seu nome era Noé. Lameque, pai de Noé, havia posto esse nome em seu filho com uma motivação muito significativa: “Este nos consolará dos nossos trabalhos e das fadigas das nossas mãos, nesta terra que o Senhor amaldiçoou” (Gn 5.29). Pelo visto, Lameque acreditava em Deus e em Sua promessa de Gênesis 3.15. Noé significa “descanso” ou “consolo”. Lameque já conectava esse nome a uma esperança messiânica, pois um dia viria o Salvador (Messias) trazendo de volta o descanso ao mundo, o consolo dos trabalhos e fadigas de suas mãos. Assim, Noé torna-se uma prefiguração profética do verdadeiro Messias, o Senhor Jesus Cristo. Um detalhe interessante nessa história: Lameque alcançou 777 anos de idade, parecendo simbolizar de forma tríplice o sétimo dia, o dia de descanso divino (Gn 5.31). E a história continuou. Mais tarde, Deus escolheu Abraão, Isaque e Jacó. Passou a chamar Jacó de Israel, cujos filhos fundaram as doze tribos de Israel (Gn 49.10-11).

Restaurando o descanso

Deus direcionava tudo para um alvo específico: levar a humanidade de volta ao Seu descanso. Essa é uma das razões porque Ele ordenou que Israel, Seu povo escolhido, descansasse no sétimo dia da semana, no sábado (Êx 20.9-11). Deus queria que Israel entrasse no descanso divino, repouso que só Ele pode proporcionar, o verdadeiro “shabbat”, o descanso em que Adão e Eva viviam antes de caírem em pecado. Mas o povo falhou continuamente. Não era capaz de obedecer aos mandamentos divinos, continuando assim sempre inquieto e intranquilo. Nem Moisés nem Josué, dois grandes líderes do povo judeu, incumbidos de conduzir o povo de Israel até a Terra Prometida, conseguiram levá-lo a seu descanso (veja Hb 4.8).

Então veio o tempo em que Deus enviou Seu Filho a este mundo. Este Filho, Jesus Cristo, é a personificação do descanso divino. Na pessoa dEle vemos mais uma vez que Deus quer trazer as pessoas para dentro da Sua paz e do Seu repouso, simbolizados pelo sábado. Assim, Jesus explicou a respeito de si mesmo: “Porque o Filho do Homem é senhor do sábado” (Mt 12.8). Jesus é o Senhor do sábado porque é o descanso de Deus em pessoa. Por isso Ele diz: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve” (Mt 11.28-30).

Foi o que já lembrou o profeta judeu Isaías, quando predisse setecentos anos antes de Cristo: “ao qual ele [Deus] disse: Este é o descanso, dai descanso ao cansado; e este é o refrigério; mas não quiseram ouvir” (Is 28.12). Foi o que realmente aconteceu.

Em sua incredulidade, Israel rejeitou o Filho de Deus e não entrou no descanso. O descanso prometido para o povo étnico de Israel como um todo não foi suspenso definitivamente, foi apenas prorrogado: “Portanto, resta um descanso para o povo de Deus” (Hb 4.9). O texto original fala que um descanso sabático espera pelo povo de Deus.

Resta um descanso

Esse descanso sabático, que ainda resta para o futuro, acontecerá durante o reino messiânico de Cristo na terra, quando Jesus Cristo voltar para reinar com poder e grande glória. Nesse grande “dia de Shabbat” milenar, Israel cessará de olhar para suas próprias obras e realizações, passando a olhar, finalmente, para Aquele que foi o consumador da Lei e que trouxe a graça perfeita. E então, quando Jesus voltar, Ele virá trazendo consigo a paz e o descanso: “...alívio juntamente conosco, quando do céu se manifestar o Senhor Jesus com os anjos do seu poder” (2 Ts 1.7).

Em Hebreus 4.2-3 são feitas duas importantes declarações sobre a salvação:

  1. A fé é necessária para finalmente alcançarmos o descanso e
  2. Este “descanso” é o descanso no próprio Deus (“no meu descanso”).

A carta aos Hebreus mostra que o descanso de Deus no sétimo dia foi, de fato, desde o começo, uma indicação evidente de que o homem só encontra seu descanso na Pessoa do próprio Deus (Hb 4.4-5).

Quem está em Cristo descansa assim como Deus descansou no sétimo dia. O homem descansa de suas obras porque não precisa tentar justificar-se por meio delas nem por meio do cumprimento de leis ou ordenanças. “Porque o fim da lei é Cristo, para justiça de todo aquele que crê” (Rm 10.4). O que Moisés e Josué não conseguiram, Jesus Cristo trouxe a todos os homens. — Norbert Lieth

Porque nós, os que temos crido, entramos no repouso

Mas vejo nos meus membros outra lei, que batalha contra a lei do meu entendimento, e me prende debaixo da lei do pecado que está nos meus membros. Miserável homem que eu sou! quem me livrará do corpo desta morte?

Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei.

Tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo; pelo qual também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes, e nos gloriamos na esperança da glória de Deus.

Porque aquele que entrou no seu repouso, ele próprio repousou de suas obras, como Deus das suas.

E seja achado nele, não tendo a minha justiça que vem da lei, mas a que vem pela fé em Cristo, a saber, a justiça que vem de Deus pela fé.

Este é o descanso, dai descanso ao cansado; e este é o refrigério.

Hebreus 4.3; Romanos 7.23-24; Mateus 11.28; Romanos 5.1-2; Hebreus 4.10; Filipenses 3.9; Isaías 28.12.

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